Ao (meu) mestre, com carinho

Por Fábio Müller Guerrini, professor do Departamento de Engenharia de Produção da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP

Fábio Guerrini aprendeu dentro e fora de casa com o pai – Foto: Henrique Fontes/SEL

Todo mundo encontra o seu caminho, mas somente alguns tiveram a sorte de encontrar em seu caminho o professor José Benedito Sacomano. Natural de Botucatu, mudou-se para São Carlos, para estudar Engenharia Civil na Escola de Engenharia de São Carlos, formando-se em 1968. No início de sua vida profissional, trabalhou como engenheiro na Fepasa e foi ao Japão acompanhar a fabricação, e depois a instalação, aqui no Brasil, de uma cremalheira no trajeto Santos – Rio de Janeiro.

Em 1980, tornou-se professor do Departamento de Engenharia de Produção da Escola de Engenharia de São Carlos, onde se aposentou em 1997, permanecendo vinculado por mais alguns anos ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção. Nesse período, dentre os diversos cargos e funções que desempenhou na USP, foi chefe de gabinete da Reitoria, na gestão do professor Roberto Leal Lobo e Silva e coordenador da Coseas, denominada atualmente Superintendência de Assistência Social da USP.

Fez parte do grupo de professores que criou o Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, que foi a semente do Departamento de Engenharia de Produção da Escola de Engenharia de São Carlos. Foi o orientador do primeiro mestrado defendido no programa.

Possuía um rico repertório e vasta experiência, espirituoso, agregador, sempre tinha uma palavra para animar, aconselhar e sugerir alternativas, uma pessoa que percebia as aptidões de cada aluno que orientava. Era um professor que ministrava as aulas com os alunos, sem ser prescritivo. Ao término de suas aulas, o aluno sentia ter participado da construção de seu raciocínio. Fazia o aluno descobrir que era mais inteligente do que imaginava. Despertava um olhar crítico sobre a realidade, sem ser pessimista. Certa vez, escreveu um artigo discutindo se os cursos de Engenharia de Produção estavam formando empregados ou empreendedores. Essa preocupação só viria a se tornar um direcionador para os projetos pedagógicos uma década depois.

Costumo dizer que ele me inventou. Em 1996, tornei-me seu orientando de mestrado e doutorado. As oportunidades que surgiam para ele, eram redirecionadas para mim. Em 1998, ministrei aulas na Unaerp, nas disciplinas de Administração de Produção e Administração de Materiais. Um ano depois, fui coordenador do curso de Engenharia Civil na Uniban, responsável pelo projeto de reconhecimento do curso. Em 2001, ele me deu a notícia que eu ficara em primeiro lugar no concurso para professor na USP. Em 2017 fui nomeado Superintendente de Assistência Social da USP, cargo que ele havia ocupado. Sempre compartilhava esses momentos com ele, que expressava a sua felicidade e generosidade.

Ele era francamente interessado nas pessoas. Gostava de ajudar os “sobreviventes”, como dizia: alunos que tiveram a sua vida desestruturada em algum momento, e que ele colocava no rumo novamente. Nunca se negou a auxiliar quem o procurava, mesmo que não fosse formalmente o seu orientador, assumia de fato a sua orientação. Formou vários doutores para a indústria. Acreditava que a competitividade das empresas podia sofrer um grande impacto com a ascensão de engenheiros a doutores em engenharia em seus quadros.

Sacomano era uma pessoa de múltiplas dimensões. Após a sua aposentadoria na USP, foi professor do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Unip, participou da criação do curso de Engenharia de Produção da Uniara, era uma presença frequente em programas de rádio, foi secretário de Ciência e Tecnologia de São Carlos, candidatou-se mais de uma vez para exercer cargos públicos.

O professor José Benedito Sacomano faleceu no dia 26 de dezembro de 2020. Ao longo de sua carreira acadêmica deixou cerca de 250 publicações e orientou mais de 100 alunos. A sua maior satisfação era perceber que o seu aluno se sentia suficiente naquilo que se propusera a fazer. “Suficiente” no sentido de ter uma compreensão de mundo que lhe dava segurança pessoal e profissional.

Isso não é pouco.

Jornal da USP

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