Artigo: Universidades e a defesa intransigente da democracia

Por Carlos Gilberto Carlotti Junior, reitor da USP, Antonio José de Almeida Meirelles, reitor da Unicamp, e Pasqual Barretti, reitor da Unesp

As universidades exerceram, ao longo dos últimos anos, um protagonismo cujas facetas se multiplicaram na mesma proporção em que emergiram aberrações advindas da condução errática do poder central. O embate, documentado a quente, foi árduo. A desqualificação do sistema de ensino superior esteve no cerne do ideário governista.

Os ataques sistemáticos à ciência, à pesquisa e ao debate manifestaram-se por meio de numerosas ações deletérias, desde o contingenciamento de verbas até falas inadequadas de representantes que deveriam zelar pelo bem público. Neste contexto, forjaram-se o caldo da intolerância e o ambiente beligerante.

Em um cenário de esgarçamento institucional e de esfacelamento de políticas públicas, as universidades, muitas das quais torpedeadas por inverdades e cortes orçamentários, constituíram-se em anteparo da incivilidade. As frentes de resistência gestadas na academia, independentemente de seus matizes e motivações, cumpriram um papel histórico.

No rol de contribuições da ciência, algumas sobressaíram-se em razão da urgência exigida pela gravidade do momento, tanto no campo da ação como no terreno das ideias. Cabe reportar, entre os exemplos, o combate ao negacionismo, o enfrentamento da pandemia de covid-19 e os alertas sobre posicionamentos com inclinações autoritárias.

Nesse último caso, são reveladores os episódios registrados no dia 8 de janeiro, em Brasília. Os atos de vandalismo não apenas materializaram o leitmotiv da extrema direita, bem como demonstraram que os inimigos do Estado democrático de Direito, saudosos de um período recente de triste memória, haviam adquirido a confiança necessária para agir à luz do dia.

A ofensiva terrorista, que mobilizou a sociedade civil e teve rápida resposta das instituições nas três esferas de poder — não por acaso alvos preferenciais dos delinquentes —, deixa lições. A história mostra que, paradoxismos à parte, situações traumáticas têm o condão de aperfeiçoar um vasto repertório de valores, inclusive os democráticos.

A academia, cuja reação à investida golpista foi também imediata, tem muito a depreender dos acontecimentos na praça dos Três Poderes. Para além de levar a cabo sua missão de difundir conhecimento, torna-se imperativa a união de forças para atenuar e, em última instância, debelar potenciais ameaças que se avizinhem.

Não é de hoje que as três universidades estaduais paulistas vêm atuando conjuntamente em questões fulcrais da vida nacional. Cientes do papel que lhes cabe, Unicamp, USP e Unesp manterão o seu protagonismo na defesa intransigente da democracia e dos princípios que as norteiam.

(Artigo publicado originalmente no jornal Folha de S. Paulo, em 17/1/2023)

Por Jornal da USP

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