USP promove primeiro congresso sobre cultura e extensão universitária

Nos dias 25 e 26 de novembro, a Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária (PRCEU) promoverá o 1º Congresso USP de Cultura e Extensão. O evento discutirá o papel da cultura e extensão no relacionamento das universidades com a sociedade, e apresentará diversas iniciativas desenvolvidas por docentes, servidores e estudantes nestas áreas. O evento é gratuito e será realizado no formato virtual.

Entre os destaques da programação, estão a conferência inaugural A responsabilidade social e a interação com a sociedade: os desafios da Universidade no século XXI, apresentada pelo ex-reitor da USP e membro do Conselho Superior do Graduate Institute of International and Development Studies (IHEID), Jacques Marcovitch; e a conferência de encerramento A cultura e as artes na Universidade como espaços dialógicos com a sociedade, com as pesquisadoras Heloísa Helena Oliveira Buarque de Hollanda e Érica Peçanha do Nascimento (leia abaixo entrevista com Marcovitch e Heloísa Buarque de Hollanda).

O congresso é uma oportunidade para que toda a comunidade amplie seus conhecimentos e troque experiências sobre as atividades de cultura e extensão, além de fortalecer a integração das universidades e entes públicos.

As inscrições para o 1º Congresso USP de Cultura e Extensão são gratuitas e podem ser feitas na página do congresso (https://prceu.usp.br/congresso/).

Laboratório de práticas integradas sustentáveis

No segundo dia do congresso será inaugurado o projeto piloto do Programa de Práticas Integradas Sustentáveis no Campus da Cidade Universitária-Butantã. Localizado em um espaço do Centro de Práticas Esportivas da USP (Cepeusp), o projeto é um laboratório aberto dedicado ao desenvolvimento de práticas de sustentabilidade e de regeneração, e abrigará uma horta agroecológica, uma composteira, um jardim de chuva e um sistema de captação de água de chuva.

A iniciativa é do programa USP Comunidade, em parceria com o Cepeusp, a Prefeitura do Campus USP da Capital (PUSP-C), a Superintendência de Gestão Ambiental (SGA) e o Instituto de Estudos Avançados (IEA).

Professores afirmam importância da extensão na Universidade

Jacques Marcovitch, ex-reitor da USP e Professor Emérito da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, e Heloísa Buarque de Hollanda, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), conversaram com exclusividade com o Jornal da USP sobre o 1o Congresso USP de Cultura e Extensão. Marcovitch participará da conferência inaugural do congresso, intitulada A responsabilidade social e a interação com a sociedade: os desafios da Universidade no século 21. Segundo o professor, sua intervenção pretende oferecer uma reflexão, a partir do contexto atual, sobre o que chama de “nova era em construção”.

“A nova era em construção é algo que já havia começado no século 21, com vários eventos que marcaram essas primeiras duas décadas: o 11 de Setembro, a crise de 2008, os desafios que o Brasil enfrenta na defesa da sua democracia e, agora, a crise sanitária”, comenta Marcovitch. “Nós percebemos que estamos vivendo uma migração para uma era digital, na qual o tema da sustentabilidade econômica, social e ambiental, com respeito à diversidade cultural, está se fazendo cada vez mais presente. E ela pode ser comparada à migração que tivemos no passado, do agrícola para o industrial, no fim do século 19 e início do século 20.”

Jacques Marcovitch - Foto: Wikimedia Commons

Jacques Marcovitch, reitor da USP entre 1997 e 2001 – Foto: Wikimedia Commons

Nesse cenário, explica o professor, cabe às universidades, especialmente às instituições públicas dedicadas à pesquisa, compreender as expectativas da sociedade, como ficou comprovado durante a pandemia da covid-19. “Temos a necessidade de entender esse contexto, dentro de um século 21 que ainda se estrutura e, ao mesmo tempo, já nos espera com o ano de 2022, marcado pelo bicentenário da Independência, uma efemeridade que deverá ser lembrada na construção da nova era.”

Para isso, Marcovitch considera fundamental dirigir o olhar para as concepções do que pode ser uma universidade. Além de um espaço de ensino e pesquisa, no qual os estudantes adquirem disciplina intelectual e aprendem a pensar de forma independente, ela é o lugar da construção de conhecimentos, identidades e projetos de vida. E é aí, destaca o professor, que o papel da cultura e da extensão é
determinante.

Marcovitch cita alguns exemplos, como as atividades que integram a extensão nos próprios currículos dos estudantes, caso dos serviços prestados por alunos de medicina nos hospitais universitários. As incubadoras de cooperativas, com seu caráter social, constituem outra atividade de extensão bastante reconhecida, agora na área das Humanidades.

“Nós temos que pensar uma universidade que respeita suas várias concepções”, pondera o professor. “Eu me refiro à concepção liberal, que é formar pessoas cultas, com visão crítica, atentas aos valores da cidadania, mas também à concepção utilitária, que é formar profissionais com habilidades técnicas para resolver problemas. E também à concepção da pesquisa e à concepção social, a formação de profissionais para responder às demandas sociais.”

Na tarefa de pensar o papel da extensão universitária, Marcovitch realça a importância de se conectar soluções de curto, médio e longo prazo para as demandas sociais. “A sociedade está vivendo crises profundas, seja na área social, como o desemprego, a fome, a exclusão social, seja na política, com a polarização fragmentadora. Portanto, como é possível pensar, ao mesmo tempo, na construção de longo prazo, com o tema da sustentabilidade ambiental, por exemplo, e conectar com as soluções que a
sociedade espera hoje?”, questiona ele.

No caso da crise sanitária, continua o docente, as universidades públicas responderam a essa demanda conjugando disponibilização do conhecimento científico, esclarecimento à população e ações dos hospitais universitários e faculdades de medicina. Respostas que deixam evidente, segundo, Marcovitch, a amplitude do termo extensão universitária, que conjuga não só museus, teatros e concertos, mas também o atendimento nos hospitais, a divulgação de informações nos portais, a troca de conhecimento com o Instituto Butantan e a presença de médicos e sanitaristas da universidade em comitês governamentais.

“Eu acredito que extensão significa tudo que é colocado a serviço da sociedade. Tudo que se alimenta da pesquisa e das atividades de ensino e é devolvido à sociedade através das várias formas de comunicação e transferência de conhecimento da universidade”, diz o professor.

“A extensão é hoje a parte mais importante da universidade”, afirma Heloisa Buarque de Hollanda, que participa da conferência de encerramento do Congresso, intitulada A cultura e as artes na Universidade como espaços dialógicos com a sociedade, na qual irá dialogar com a pesquisadora Érica Peçanha. “A sociedade está precisando muito das soluções da universidade. Ela tem que apertar o acelerador e começar a pensar nos problemas sociais de hoje, para ajudar com políticas públicas e fazer frente a posições do Estado muito conservadoras.”

Heloisa é a coordenadora do Laboratório de Tecnologias Sociais do projeto Universidade das Quebradas, que existe há 12 anos e propõe um intercâmbio entre o que ela chama de saber acadêmico e saber vernacular da cidade. “Está na hora da universidade se manifestar mostrando um pensamento social importante, mostrando soluções, trazendo realmente soluções e projetos, menos do que reclamações. Ficou evidente com a covid-19 que a desigualdade social é muito gritante e cruel. E eu acho que a universidade, assim como se apressou em soluções para a vacina, tem que se apressar também em soluções para a desigualdade, a injustiça e tudo o que vimos com mais clareza durante a pandemia.”

Heloísa Buarque de Hollanda – Foto: Wikipédia

Se extensão é um conceito abrangente para Marcovitch, o mesmo pode ser dito de cultura, o outro termo do dístico que batiza o congresso. Na visão do professor, três noções devem ser pensadas quando se fala em cultura: valores, construção de identidade e a universidade como ofertante de iniciativas culturais.

Se o Código de Ética da USP é lembrado pelo docente como documento exemplar da concepção de cultura enquanto valores, os equipamentos tais como museus, bibliotecas e teatros, além de iniciativas como o Projeto Nascente, são os locais de construção da identidade. Por fim, a terceira dimensão da cultura
dentro da Universidade engloba ações como o Universidade Aberta à Terceira Idade ou iniciativas junto ao entorno, como a Comunidade São Remo.

“Se eu tiver que resumir, nosso denominador comum é a formação de jovens com espírito crítico, pensamento independente e essa cultura de país que nós queremos”, pontua o professor. “Uma juventude que possa construir um futuro melhor. E ela se compõe em termos de valores, de manifestações culturais que ajudam a construir uma identidade e de uma expressão de cultura levada para a comunidade externa.”

Heloisa também pensa o termo de maneira plural, mas enfatiza seu caráter processual. “Cultura tem tantos significados e não é por acaso”, comenta a professora. “Se você observar etimologicamente as atribuições da noção de cultura, verá que ela muda ao longo dos anos. E todas elas mostram um contexto social diferenciado, um movimento social por trás. É isso que a universidade precisa pegar: esse movimento da palavra cultura. Não esse ou aquele conceito de cultura, mas esse processo de transformação da noção de cultura”, finaliza.

Por: Erika Yamamoto e Luiz Prado
Arte: Simone Gomes
Jornal da USP

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